Exclusivo! Encontro
com o Senhor de Castelo Thagir!
Informe do Multiverso
Começando transmissão...
–Gente,
vocês não vão acreditar! Lá estava eu, no meu horário de descanso, observando
toda a imensidão da ilha de Ev’ve na torre da chama eterna, quando descubro que
o mestre Thagir também tira um tempo pra relaxar e esticar as pernas no mesmo
lugar que eu! E como ele me permitiu emitir para todas as Ordens de Senhores de
Castelo do Multiverso a nossa conversa... Aqui vai!
...
Fentáziz
abre uma cartucheira, tira de dentro um cigarro e o acende com uma chama de
maru laranja que faz surgir magicamente:
–Você não
deveria fumar nas dependências da ilha de Ev’ve... – Disse Thagir, subindo as
escadas.
–Ahn?! –
Fentáziz procurou quem disse aquilo. – Ah, mestre Thagir! Se importa? Este é o
único lugar em que eu consigo fumar sem ser interrompido pela guarda castelar.
–Não... Mas
este é um lugar sagrado, insisto que você não deveria fazer isso. – Fentáziz
então dá uma grande tragada; a cena era muito melancólica, seu rosto não estava
nada feliz.
–Bem... O
que o trás aqui? Há anos que sou o único que se lembra deste lugar numa hora
como essa.
–Venho aqui
desde a época da Academia e as coisas não vão exatamente bem no serviço de
repressão...
–Sei. Tudo
é bem feito, eles procuram sempre as melhores brechas... Afinal, sou eu quem
está transmitindo tudo isso!
–Me diga
uma coisa Fentáziz, se você estivesse no meu lugar, o que você faria?
–Depende. Todos
os fatores devem ser...
–...muito
bem questionados. Aula de Estratégias e Estratagemas. Última aula daquele
professor baixinho... Ele ainda dá aulas na Academia?
–Sim e
ainda continua rabugento como sempre!
Os dois
riram, pareciam dois colegas, dois aprendizes que se conheceram no primeiro dia
e se tornaram amigos de infância.
–Então,
Fentáziz, muito se fala de você, mas ninguém sabe de nada... Porque isso? –
Fentáziz deu outra tragada.
–Sabe o que
é ter mais de cem anos e ainda não ter sido aprovado na Academia?
–Não brinca!
Mas você parece mais jovem do que eu! – Thagir olhava incrédulo.
–Heheh...
Digamos que eu não tenha tanto orgulho de mim. Eu tive a sorte de me concederem
à honra de fazer as primeiras transmissões do novo sistema de emissão específica
de maru há alguns anos e tenho sustentado elas com todo o meu empenho. Sabe
quantas pessoas trabalham no Informe do Multiverso?
–Verdade...
Nunca reparei nisso também. Quantas pessoas trabalham lá?
–Duas... Eu
e o cameraman. Ele também não deu muito certo na prova dos trezes dias e se
juntou a mim para fazermos esse bico por aqui. O Informe do Multiverso não vai
durar muito, não é? Estão desconfiados que eu ou que as transmissões estejam
vazando informações importantes para os Caçadores Sombrios. Estou certo?
–... –
Thagir ficou calado por um instante, era como se Fentáziz adivinhasse que ele
queria falar justamente sobre o fechamento do Informe do Multiverso.
–Não tem
problema... – Ele sorriu. – Não tem como haver mais lugar pra mim mesmo aqui.
–Você tem
certeza? Eu posso falar com os anciões...
–Por favor,
não insista. Mesmo que eu continue aqui por algum tempo, alguém por aí ainda
vai encontrar um jeito de usar o Informe do Multiverso contra os Senhores de
Castelo. Às vezes temos que saber a hora de desistir e encontrar algo novo para
fazer... – Por algum tempo, o silêncio pairava no ar, incomodando aos dois,
sendo quebrado apenas pela última e profunda tragada de Fentáziz que logo
terminou de apagar a bituca e escondê-la na cartucheira.
–E o que
você pensa em fazer depois daqui? – Perguntou Thagir.
–Bem, como
eu sou um mago, vou continuar meus estudos em algum lugar, eu acho... Não tenho
muita certeza do que fazer exatamente. Possibilidades demais para se fazer uma
única escolha.
–E o seu
planeta natal? Você não disse de onde veio.
–O planeta onde
nasci não existe mais... Foi consumido por uma explosão solar que o desmanchou
no espaço. Eu já havia sido mandado para cá alguns anos antes e por um acaso
acabei sobrevivendo. Como era um planeta do primeiro quadrante que não tinha
muitos recursos naturais, seu comércio com outros planetas era nulo. Apesar de
haver um portal marcando a saída para os mares boreais, ninguém saía de lá. No
entanto, diversos foragidos espaciais se escondiam e escravizavam a população.
Foi o próprio N’quamor que liderou a derrota dos bandidos e libertou meu povo,
antes de ser oficialmente eleito o próximo regente da Ordem de Nopporn. Chego a
pensar que o que ele fizera fora em vão. De qualquer jeito o planeta seria
expurgado do multiverso...
–Você é o
último de sua raça?
–Acho que
não preciso dizer... Bem, há algo que eu queria dizer, mas não consegui até
agora.
–Pode
dizer, estou ouvindo
–Você
conhece a lenda dos planetas Curanaã e Oririn?
–Que lenda?
– Thagir tentava se lembrar, puxando pela sua boa memória, mas nunca tinha
ouvido falar que o seu planeta e o planeta de Kullat tinham uma lenda em comum.
–A lenda
dos Deuses Gêmeos... Bem, a história é mais ou menos assim. Quando o multiverso
ainda não existia, existiam apenas os seres de Ébano, os seres primordiais que
habitavam o vazio e desenvolviam a existência a seu bel-prazer. Em seus
devaneios eles brigavam constantemente uns com os outros para descobrir quem possuía
a melhor ideia. Dentre essas criações surgiram os Comedores de Sonhos, seres
titânicos e maldosos que consomem qualquer ideia. Para poder preservar a suas
próprias ideias, a Grande Mãe deu a luz a deuses gêmeos iluminados, Brasman e
Norris. Suas ideias eram novas e seu carinho pela criação era tremendo. Os Comedores
de Sonhos, porém, são seres famintos e insaciáveis. Quando destroçaram seus
próprios criadores, foram atrás das ideias dos jovens deuses que lutaram bravamente
para preservar aquilo que a Grande Mãe e eles criaram. Foi então que nasceu a
melhor ideia que eles poderiam ter: a Espada do Infinito, um instrumento divino
que uniria suas forças opostas e expulsaria os comedores de sonhos de sua
morada. Pelo que diz a lenda, a força emitida pela espada foi tão grande que se
propaga eternamente formando os dois multiversos...
–Como
assim, dois? A teoria que emenda todos os universos no multiverso não se aplica
a tudo? – Interrompeu Thagir, interessado na conversa.
–Sim, o
multiverso é um só... Só que ele é dividido em dois. Um lado positivo e outro
negativo. Pelo que se entende ainda existem emissões do outro multiverso sendo
propagadas, elas apenas não duram muito, se desintegram rapidamente. Digamos
que desse lado, existe a maru em grande quantidade e do outro, a antimaru em
grande quantidade. Se quantidades iguais dessas duas energias se juntarem, elas
se desintegram. No meio de tudo isso, uma fina camada de vazio ainda continua,
equilibrando os dois lados. Os Comedores de Sonhos estão presos lá e o que
garante que tudo se mantenha do mesmo jeito são as Estrelas Escuras, as ideias
mais bem arquitetadas para a sobrevivência das ideias da Grande Mãe.
Thagir
estava maravilhado com o achado, do lugar que menos se esperava, surgiam respostas
para muitas perguntas:
–E onde os
planetas Curanaã e Oririn entram nisso?
–Eles são
os restos dos deuses Brasman e Norris... A Espada do Infinito consumiu toda a maru
vital deles e se dividiu em duas, vagando pelo multiverso. Um lado gerou
Curanaã e a outra Oririn quando encontraram orbitas de rochas e poeira em seus
respectivos sistemas... Bem, é o que o culto a Grande Mãe prega. Ele quase não
existe mais, os últimos que adoraram a Grande Mãe eram os espectros e, veja,
eles quase foram extintos.
–Como você
sabe de tudo isso? Nem eu nunca ouvi falar disso e provavelmente Kullat também
não.
–Tudo está
nos Códices de Oririn e Curanaã... Duas ideias que só são compreensíveis
juntas. Quando se tem tempo de sobra pra ler e estudar culturas primitivas e
mortas, às vezes você encontra algo quando alguém acidentalmente mistura tudo.
–E onde
estão os Códices agora?
–Em seus
respectivos planetas, guardados como relíquias nas sedes das ordens por
Senhores de Castelo sob o comando direto de N’quamor e Lorde Grageon. Isso já
faz mais de cinquenta anos...
Thagir
estava felicíssimo com as novidades, sabia que Fentáziz tinha seus motivos para
guardar o segredo que somente ele descobriu por acaso e não teve dúvidas,
apertou-lhe a mão em sinal de agradecimento:
–Pode
publicar isso, meu caro, quero que todas as sedes saibam da lenda dos Deuses
Gêmeos!
Nesse
momento, Kullat, que procurava por Thagir, subia as escadas. Ele ia dizer algo,
mas foi abruptamente interrompido por Thagir:
–Velho amigo,
vamos viajar!
Os dois
desceram e Thagir apenas acenou para Fentáziz, sem maiores despedidas.
...
–Foi isso o
que aconteceu... Acho que os dois vão viajar de volta para casa essa noite.
Dessa ve vc se superou. Arrepiou aqui meu caro! Adorei a homenagem...
ResponderExcluirOutra coisa: você leu sobre a Maru negativa em algum lugar? Por que não me lembro de ter falado sobre ela ainda...
Cara, que coisa. Estou boquiaberto aqui. Adorei a homenagem e também as idéias: Comedores de Sonhos... instigante e muito interessante. Parabéns! Gostei muito!
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