Interseção
“Como tudo
isso foi acontecer?”, perguntou-se Ferus, confuso com a cena em que se via.
Estavam todos os seis Senhores de Castelo enviados ao planeta sem nome na
plataforma aérea. Westem segurava Ferus firmemente, prendendo-o na parede por
ter desobedecido Dimios. O jovem castelar olhava para todos e seus olhares não
eram nada convidativos, pelo contrário, estavam preenchidos de ódio e desprezo:
– Você
cometeu o erro de deixá-lo vir aqui, agora aguente as consequências! Nós vamos
entrar no ecossistema artificial dos altarianos e teremos de enfrentá-los... –
disse Nerítico, encarando Ferus, completamente ressentido.
– Tsc... – fez
Pilares. – O moleque deu mancada!
– Quietos
vocês! Preciso me concentrar para que a eletro-erosão seja rápida. – Dimios
estava carregando a Garra de Sartel ao máximo para derreter as fechaduras dos
portões do paraíso que os separavam da corte cósmica que se escondia ali.
– Qualquer
um comete erros... – ponderou Iksio com sua educação refinada. – Nós enfrentaremos
os altarianos com força e sobreviveremos!
– Belo
discurso peixinho de aquário. – disse o bárbaro, parceiro do arthuano. – O que
vimos lá embaixo é só uma prévia do que está por vir.
– Eu já
disse para ficarem quietos! – o poder da Garra de Sartel explodiu em fagulhas
flamejantes.
Por um
instante eles ficaram quietos. Pilares, com sua curiosidade, ficou mexendo no
cilindro de armeiro de Ferus. A jóia púrpura de sua base brilhava aos olhos do
ladrão, que logo pensou e concluiu:
– Onde
conseguiu essa jóia? – disse secamente.
– Ela é
minha... – Ferus pensava em algo para dizer, mas a memória lhe falhava. –
Alguém me deu ela.
– E quem
daria uma jóia com emanações sombrias para um castelar? Você deve ser mesmo
muito ingênuo para usar uma coisa dessas!
– Ela não
tem efeito sobre mim, se é o que você quer saber...
– Ah! Isso
me lembra... Como você sabia daquelas coisas? – Pilares estava afiando suas
facas, que pouco lhe foram úteis contra as grandes máquinas da legião parafuso.
– Eu não
sei! – Ferus perdia a paciência, se sentindo incomodado por ter tantas falhas
na memória. – Eu juro que eu não sei...
– Vai
chorar agora? Seja homem! Seja um castelar de verdade ao menos uma vez! – disse
Westem.
– Como é
que tudo isso foi acontecer? – disse Ferus bem baixinho, se lembrando dos
momentos anteriores a difícil ascensão a cidade aérea...
...
Voltando no
tempo, Ferus, Westem, Dinha, Toshi e Esmal conversavam no interior do mercado
negro. Toshi era traduzido pela senhora idosa e Esmal usava de sua telepatia para
falar através de Westem. Eles conversaram sobre tudo o que havia no planeta,
trocando algumas poucas ideias. Ouviram uma barulho do lado de fora da loja e
saíram para ver. Encontraram Dimios que surgia de um buraco no chão:
– Caramba!
De onde você está vindo? Foi rejeitado do Naveeh? – Westem, com seu jeito
amistoso, ofereceu a mão ao castelar que continuava com seu ar ranzinza.
–
Obrigado... Mas quem precisa de ajuda está aqui embaixo... – Dimios pouco ligou
para a mão estendida do castelar e puxou para cima uma criança. – Cuidado com
eles...
– Por quê?
São apenas crianças... – Westem estendeu o braço dentro do buraco e puxou a
outra. – Não são?
– Essa
crianças enfrentaram máquinas enormes e monstros amorfos aqui embaixo...
– Como?
Isso é possível? – o bárbaro olhou para o amigo Esmal, tentando entender o que
ocorria naquele planeta.
Esmal pegou
na mão de Westem e lhe disse algumas palavras: “Eles são perigosos... Posso
sentir claramente as energias que são emanadas deles e não são nada boas.”.
Westem sentiu um calafrio percorrer a espinha:
– E qual o
nome de vocês?
– Meu nome
é Vaik e este é o meu irmãozinho Elians... – respondeu o irmão mais velho
enquanto o mais novo se escondia atrás dele. – Não somos deste planeta.
Westem
ficou sobressaltado, sabia que Esmal lia sua mente ao tocar em sua mão, mas
ficou surpreso ao perceber que aquele garoto lera sua mente perfeitamente. E
continuou, voltando-se para o colega castelar:
– Ah, já ia
me esquecendo. Vamos entrar ali, Ferus ficou lá dentro. – o bárbaro havia
notado que o jovem castelar estava constrangido e resolveu não aparecer quando
viu Dimios.
Na verdade,
Ferus sentia outra coisa lhe incomodando. Por mais que Dimios fosse lhe dar uma
bronca pelo que aconteceu, sua consciência de castelar ajudava-o a pensar
diferente sobre o parceiro que pouco havia sido amigável. Ferus sentia algo
ruim sim, mas não era de Dimios, era de Vaik. Desde o momento em que Vaik saíra
do buraco, o armeiro sentia que aquela criança olhava diretamente para ele,
estranhamente sorrindo. O castelar pensou que pudesse ser coisa de sua cabeça e
que deveria colocar a máscara de gás novamente. No entanto, não tinha como
aquilo ser causado pelos gases tóxicos, era algo vindo daqueles dois. “Espere!
Dois?”, perguntou-se Ferus escondido atrás da porta. Olhou novamente e concluiu
que realmente haviam duas crianças ali, principalmente porque elas estavam
vindo para dentro da loja. Ferus percebeu algo de familiar naquela criança
menor que estava em cima das costas da outra. Não sabia o que era aquilo, tal
qual não sabia o que sentia de medo pela outra. Sua cabeça estava confusa.
Suava debaixo daquele macacão prateado que pouco lhe aquecia o corpo. O coração
estava disparado. Ele ouviu a porta destrancar... Desmaiou, assustando a todos.
...
Pilares
procurou por Iksio o quanto pode, sem tentar chamar a atenção da criatura que
provavelmente o havia devorado de uma maneira tão estranha... Bem, era apenas
um pensamento fértil de sua mente leviana, mas que lhe parecia bem plausível no
momento:
– O que é
isso Pilares? Sentindo medo numa hora dessas? O que há com você Senhor de
Castelo? – os sibilos estalados ainda eram ouvidos ao longe. – É melhor eu não
ficar aqui!
Ele subiu
num dos montes de entulho e de lá avistou uma orbe brilhante que refletia as
luzes pálidas do céu do planeta sem nome. Como bom ladrão, a visão de algo
brilhando lhe instigava e correu de pulo em pulo para chegar mais perto. A
coisa que o perseguia estava perto, sentiu seu cheiro, ouviu os barulhos que
ele fizera e voltou a ficar em seu encalço. Pilares via aquela imagem gigante
se formar na neblina e apertou o passo o máximo que podia. Seus reflexos eram
rápidos e certeiros, desviar de algo em pleno movimento é que estava sendo
difícil. Chegou a orbe e tentou se esconder debaixo dela, caindo em um buraco.
O barulho de um focinho espreitou pela pequena abertura fazendo um pouco de
poeira voar e foi embora. O cheiro ali dentro não era agradável.
...
Pilares
estava atordoado com a queda, sentia que sua suit de sobrevivência fora
removida. Temia estar no lugar errado e não quis abrir os olhos. Ouviu uma voz
amiga e finalmente olhou para o lugar em que estava:
– Pilares!
Que bom que esteja bem! – disse Westem. – Com você, Dimios, Ferus e eu somos
quatro! Agora só faltam dois.
O castelar
assaltante se sentiu mal, a possibilidade de Iksio estar morto lhe assombrava:
– Não se
preocupe. Ele está bem... – disse Vaik. Pilares olhou para a criança
encarando-a. – Hahah... Calma, este é o meu dom. Eu leio mentes, sinto as
pessoas que estão no planeta... Entre outras coisas.
– E quem é
você garoto?
– Meu nome
é Vaik... – a criança apresentou as novas pessoas ao Senhor de Castelo.
– Da onde
você saiu? – indagou Pilares, sendo direto.
– Eu não
sou daqui. Eu e o meu irmãozinho estávamos viajando em uma nave estelar e ela
caiu neste planeta...
– Era
você?!
– Você está
falando da transmissão fantasma? Vi Dimios pensando nisso. Aparentemente alguém
estava nos filmando naquele momento... Não tenho a mínima ideia do que tenha
sido, pois tenho certeza de que não foi alguém. – o ar de Vaik era de um
intelectual experiente pensando em suas conclusões.
– Você é
muito louco moleque! Gostei de você! – Pilares se animou, sentiu que podia
confiar naquela criança, ao menos na possibilidade de Iksio estar vivo. –
Falando nisso, porque tiraram a minha suit?
– Isso eu
posso explicar. – Dimios acabara de entrar no pequeno quarto. – Não podemos
morrer de causas naturais neste planeta.
– Como
assim? – perguntaram Westem e Pilares ao mesmo tempo.
– Eu já
havia sentido esse cheiro purgante que empesteia este planeta no laboratório de
um alquimista negro.
– E o que é
homem? Diga! – apressou-se Westem, ansioso.
–
Panacéia... Todo o planeta esta imerso em panacéia.
– Aquela
mistura sagrada que poderia curar todas as doenças? – indagou Pilares.
– Acredito
que sim. Não tenho certeza, as misturas que podem gerar a panacéia perfeita são
muito específicas, podendo levar a loucura ou a morte. Mas já enfrentei uma
criatura amorfa que me atacou e ela não parou de se mexer mesmo tendo sido
mortalmente perfurada. – Dimios retesou as junções da Garra de Sartel,
produzindo alguns barulhos enquanto se sentava. – Os gases podem ser tóxicos,
mas não vamos precisar nos preocupar com eles agora. Nosso objetivo é outro...
– E onde
está Ferus? – o teslarniano olhou para Westem, reparando que ele não estava
junto deles.
– Ele
saiu... Precisava respirar. – respondeu Vaik, sorrindo, lembram-se de como ele
estava assustado ao vê-lo. – Vou ver como ele está...
O garoto
saiu. Dimios estava distante, pensou em falar com o parceiro, mas percebeu que
pensava nele lembrando-se de Cardial e se retraiu. Sentia que deveriam
conversar o quanto antes e estipular uma relação de parceria. Ou será que não?
Aquele cabelo azul lhe chamou a atenção, o que poderia significar aquela
mudança de cor?
...
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