quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Crônicas dos Senhores de Castelo: Fanzine - O Filho do Fim - Capítulo 36


Matando Um Açougueiro

 

            – Então você está aí... Alquimista! – Ferus encarava o açougueiro mirando nele o canhão de seu cilindro. A criatura estava num quarto com pouca luz, sentado numa cadeira e balbuciava baixinho frases sem nexo aparente.
            – Tenho que salvar Monaro... Ele é meu amigo... A árvore de carne o levou... O ilusionista vai me ajudar... Eu sei que posso conseguir... Eu tenho tudo o que preciso aqui... Eu vou ajudar Monaro... Não posso deixar o meu amigo assim... Eu tenho que conseguir... O ilusionista me deu tudo... Tudo... Tudo... Monaro... Monaro... Se eu der isso pra ele, ele vai voltar ao normal... Vai ficar tudo bem... Tudo vai ser como antes... Tudo vai ser como antes...

...
            “Aonde aquele moleque foi!”, pensava Dimios, procurando por ele. Iksio fez sinal de que iria falar algo, mas guardou o que tinha para si, vendo que se enganara demais pra uma vida. Westem também se manteve quieto, já não sabia mais se estava entre amigos ou cópias de amigos. Nerítico, com seu ar analítico e distraído, tentava rever a sua capacidade avançada de cálculos equacionários para ter certeza de que ainda era capaz de ser um ultraquímico. Porém, também receava que os outros pudessem ser dopelgangers. Pilares havia sido substituído por um polímero copiador e ninguém percebera a diferença, causando desconfiança em todos.
            O ziniano, que ia à frente, notou novamente o sinal fantasma de Ferus como na vez em que estavam nas câmaras de tortura da Dama. O sinal parecia fraco – ou o armeiro não conseguia se concentrar, ou ele estava ainda muito longe. Dimios optou pela segunda possibilidade e apertou o passo. Percebendo que poderia ser um erro se separar dos outros castelares, voltou-se para os outros:
            – Vamos andar mais rápido! Acho que tenho uma pista de Ferus! – eles ouviram e o seguiram.
            No meio do caminho, encontraram com Rigaht – o inverso de Thagir.
            – Olá, Senhor de Castelo, é um desprazer revê-lo!
            – O que você quer conosco Caçador Sombrio?! – a Garra de Sartel faiscava com a agitação.
            – Só vim aqui para lhe dar uma pequena notícia... – Rigaht sorria maliciosamente.
            – E que notícia poderia ser? Decerto que mentiria para nos confundir!
            – Ah! Não é mentira, não! O que venho lhe dizer é algo que você já deve ter percebido... Um dos castelares que estão com você não passou no teste do décimo terceiro dia... É só isso... Se você vai se confundir com isso, não é problema meu. Quem lidera é você... – e sumiu numa fumaça negra expelida por seu próprio corpo.
            – Desgraçado! – a raiva e a desconfiança fizeram Dimios lançar uma rajada elétrica intensa no lugar em que o Thagir vermelho estava, fazendo voar uma grande quantidade de poeira.
            – Dimios! Se acalme! – gritou Nerítico.
            – Esse desgraçado... Só veio confirmar as minhas dúvidas...
            – Mantenha se calmo, precisamos nos concentrar. Perder a razão agora só irá nos enfraquecer e...
            – Mais alguém morra? Não preciso disso, obrigado! – respondeu com rispidez.
            – Pilares não está morto!
            – É bom que não esteja... E espero que aquele moleque esteja vivo, pois eu mesmo irei matá-lo!
            – Dimios... Qual o problema? O caçador só veio nos deixar mais dúvidas, não veio? – Nerítico não tinha ideia das conclusões do ziniano.
            – Eu preferiria que sim... – e continuo o caminho, apertando o passo. – Não se afastem!
            E continuaram seguindo ele.
...

            – Onde está Pilares?
            – Eu tenho que conseguir o ingrediente da panacéia... Ele vai reviver todo mundo... O planeta pode ser revivido... O ilusionista me prometeu... Eu consigo... Eu sei que consigo... Não tem como dar errado... Monaro vai me perdoar...
            – Tálio?
            – O que você quer? Eu não tenho tempo... Eu tenho que terminar a massa dos homúnculos... A árvore de carne tem que me devolver o meu amigo... Ela vai me devolver o meu amigo... – sua voz era muito baixa, quase sumindo, o açougueiro dava sinais de loucura certa.
            – A árvore está morta...
            – E Monaro?
            – Sumiu...
            – O ilusionista vai trazer ele de volta... Ele tem que trazer... Ele vai trazer... Todo o meu trabalho servindo a luz vai dar resultado... Tem que dar... Tem que dar... Rubber sabe o que fazer... Ele sabe como fazer... Ele prometeu pra mim...
            – Ele mentiu...
            – Não... Ele não mentiria pra mim... Ele me prometeu... Ele tem que trazer Monaro de volta... Já faz um ano que eu estou aqui... Ele me disse que amanhã Monaro voltaria... Ele me prometeu... Ele tem que cumprir... Rubber sempre cumpre suas promessas... Ele vai me trazer Monaro de volta... Monaro vai me perdoar...
            – Onde está Pilares?
            – Eu tenho que ajudar Monaro...
            – Onde está Pilares?! – Ferus perdia a calma.
            – Com Rubber... Quem é você? Porque você está aqui? Foi o ilusionista que te mandou? Você poderia falar com ele? Eu preciso de mais material... Você pode falar com ele? Pensei que houvesse mais materiais pros homúnculos... Eles sempre acabam tão rápido... Achei que tivesse o suficiente pra fazer cem... Você vai falar com Rubber? Quem é você?
            Uma névoa negra começou a ser emanada de Tálio, como se estivesse viva e tomava todo o laboratório de alquimia. Seus longos dedos escuros que tocavam o chão levantaram-no da cadeira em que estava e, estando de pé, eles esticaram repentinamente na direção de Ferus que só teve tempo de largar o cilindro para escapar.
            – Droga Tálio! Você é um Senhor de Castelo!
            – VOCÊ! EU DEVERIA SABER QUE ESTARIA POR TRÁS DISSO! – sua voz estava elevada, grossa e duplicada.
            – Quem diria, não acha? Nos revermos agora? – o cabelo de Ferus intensificou o tom vermelho e ficou rubro. Uma doce melodia começou a tocar.
            – ESSA MALDITA MÚSICA! EU TINHA CERTEZA QUE TINHA DESTRUÍDO TODAS ELAS!!! – o açougueiro se contorcia, não conseguia se aproximar do jovem castelar.
            – Pois esqueceu esta! – e tirou a caixa de música do bolso. – Que encontrei justamente neste planeta!
            – MINHAS ONDAS DE ALUCINAÇÃO! PRECISO DE MAIS! VOCÊ NÃO VAI ME DERROTAR SEU ANIMAL! – seu corpo se dividiu em diversos apêndices longos e finos que se desmembravam e se prolongavam em novas extensões ainda mais finas que se entrelaçavam. – TENDE DETER O MEU APANHADOR DE SONHOS!!!
            – Eu não preciso...
...

            Os Senhores de Castelo finalmente encontraram o prédio em que Ferus estava. Tiveram de arrombar uma ou duas portas envelhecidas que fechavam inutilmente o caminho e subiram todas as escadas. No último andar havia uma única entrada para uma sala completamente escura. Eles sentiam um terror sinistro brotando daquela sala contrastando com uma simples canção de ninar harmoniosa e suave. Dimios deu um passo a frente e a escuridão o atacou. Seu reflexo foi rápido e pôs a Garra de Sartel para defendê-lo, fazendo a coisa escura receber uma descarga elétrica e retroceder. Impaciente ele gritou.
            – Ferus!
            Ninguém respondeu. A escuridão permaneceu igual.
            – Ferus!!!
            Um estalo foi ouvido e o breu foi se dissipando gradativamente. Finalmente podendo entrar, Dimios e os outros castelares encontraram Ferus de um lado e o açougueiro de cabeça protuberante e rosto pequeno do outro, no chão. Nerítico, lembrando dele quando Darla morreu, tremeu, sentindo um frio agonizante na espinha. Iksio, mais acostumado com análise de corpos, piscou os olhos de peixe algumas vezes e virou o açougueiro um pouco para o lado, a parte posterior do crânio estava estourado com uma precisão cirúrgica num ponto mortal. A vítima sequer perceberia que haveria um microbomba no local. O ziniano olhou para o armeiro que estava com o cabelo azul:
            – Pilares está vivo... – ele sorria, meio sem entender exatamente o que estava acontecendo.
            Dimios lhe deu um soco na cara. O rapaz voo para trás, seu lábios ficaram cortados e um arranhão na maçã do rosto sangrava. Ele cuspiu sangue:
            – Por que você fez isso? – Dimios hesitou em dizer, rangendo os dentes e engolindo a seco.
            – Você não é um Senhor de Castelo!



...
 

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