Um dia como
os outros, En’hain estava cuidando da Toca dos Gatos sozinho, Gurei havia
levado Akai para passear pela vila e comprar alguns docinhos que, sem motivo
aparente, haviam acabado. En’hain pensava na vida, lembrando de sua velha sina.
Desconhecer o futuro, não entender o presente e não querer lembrar-se do
passado sempre o atormentava. Mas tinha bom coração, era o que importava.
Talvez sim, provavelmente não...
Ao sair
para limpar a entrada, En’hain se deparou com um inunin, um homem cão, um lobisomem
se preferirem. Ele estava esfarrapado e parecia com fome. Qual não foi a
surpresa de En’hain quando ele disse:
–Se me der
um prato de comida, passo varrer pra você. – O homem cão parecia meio
constrangido em dizer aquelas palavras, qualquer um ficaria constrangido em
falar algo parecido.
–Entre... –
Disse En’hain, lembrando que seu amigo Gurei um dia também havia chegado à Vila
dos Gatos num estado parecido.
Lá dentro,
En’hain não se demorou na cozinha e serviu um prato de sopa bem quentinho que
já estava preparando para o almoço. Um prato a mais servido não faria falta.
En’hain ficou admirando o novo espécime que conhecera, tinha cara de cachorro,
diferente dos nekos que geralmente tem uma forma mais humana e que podem se
transformar em completamente em humanos ou completamente em gatos. O ‘cão sem
dono’, como En’hain achava lhe parecer melhor o convidado, verteu a sopa com
entusiasmo, chegando a pedir mais algumas vezes. Estando satisfeito, levantou
se, pegou a vassoura e foi varrer a entrada do bar, como havia prometido.
En’hain sorriu:
–Meu nome é
En’hain, qual é o seu? – Perguntou, percebendo o deslize.
–Meu nome
ser Sasha, eu vir do grande mãe Rússia. – O inu abriu as mãos tentando
demonstrar o quão grande era o seu país.
–Então é
russo... Não deve conhecer esta região da Europa, eu presumo.
–Dah! –
En’hain não falava russo, mas sabia que aquilo significava sim.
–E o que te
trouxe a essas bandas?
–Estar
procurando amigo...
En’hain
sentiu certa nostalgia, estava achando aquela simples conversa algo incrível:
–Hun, e
sabe onde ele está? – Indagou En’hain.
–Ele partiu
pro Vila dos Gatos, saber onde é?
–Meu amigo,
você está nela! – En’hain pôs a mão no ombro do inu, que começou a abanar a
longa cauda freneticamente.
–Então você
conhecer um gato de pelo cinza azul com um olho?
–Isso até
parece de javu! Então você conhecer Gurei? Quero dizer, ele trabalha aqui...
–(Finalmente!)
– O inu falava em russo, mas sua animação era compreensível, aparentemente ele
deve ter feito a mesma loucura que Gurei. – Encontrei Alexander!
–Heheh... –
En’hain sorria, mas em seus pensamentos ele pensava algo como “Porque aquele
desgraçado não me disse?”.
Nesse
momento Gurei, que trazia Akai nas costas, estava chegando ao bar:
–En’hain! –
Gritou ele sem perceber que Sasha estava ali. – Como é que você agüenta essa
pirralho o tempo to... do... Mas que merda é essa?!
–Me parece
que um amigo seu da Rússia veio te visitar... – Disse En’hain, com um sorriso
sarcástico no rosto enquanto pensava: “Heheh, se fudeu!”
–Alexander...
– O cara de cachorro estava atônito com a chegada de seu amigo. – Senta! –
Disse de repente e entrou dentro do bar.
–Ora seu! –
Gurei xingou muito o inu, falando pela primeira vez em russo ao mesmo tempo em
que deixou Akai no chão e ia sentando calmamente, do jeito dele, numa cadeira
das mesas externas. – En’hain, seu desgraçado, onde foi que você achou o
Sasha?!
–Nyaaa?! –
Akai estava confuso com aquilo.
–Então ele
é o seu dono?! Pensei que tivesse sido criado por humanos...
–Argh! Eu
fui... Pelos pais dele, ele era muito pequeno pra saber da minha existência...
Aliás, eu não tinha a menor ideia de que ele era um lobisomem...
–Heheh... –
Akai subiu nas costas de En’hain enquanto isso.
–Tire esse
sorrisinho da cara, senão eu arranco o teu coro de dragão! – Gurei apontava as
garras felinas com olhar assassino.
–Relaxa! –
En’hain olhava para Akai que estava com a cabeça em seu ombro.
–Ahn? –
Gurei estranhou, pensava que En’hain iria tirar sarro da cara dele.
–Ele era
diferente, não era? – En’hain deu um pirulito para Akai.
–...?! –
Gurei parou por um instante, desviando o olhar em seguida.
–Me diga
uma coisa, o que os pais dele faziam? – En’hain deu um pirulito pro Gurei
também.
–... –
Gurei hesitou por um instante. – Eram da máfia russa...
–Então tá
explicado... Veja, ele está voltando.
O dialogo
estava se desenrolando em russo no começo, mas acabou por terminar na nossa
língua:
–Por que
você fugir? – Perguntou Sasha.
–Porque eu
quis... – Gurei desviava o olhar.
–Ele não
aguentava mais os maus-tratos... – Se intrometeu o barman.
–En’hain
não se intrometa na nossa conversa! – Gritou Gurei.
–Nem
pensar... Você é meu amigo e ele precisa saber... – En’hain fazia cafuné em
Akai.
–Saber o
quê? – Procurou saber o cão russo.
–Droga! Ele
não precisa saber... – Gurei estava muito exaltado.
–Saber o
quê?! – Insistiu Sasha.
–Foram os
seus pais que deixaram essa cicatriz no rosto dele...
–Filho da
puta! En’hain, você me paga!!! – Gurei estava mais violento que gato com medo
com de água que sabe que vai tomar banho.
–Eu já
saber... – Falou Sasha.
–Ahn?! –
Gurei estava confuso.
–Como é?! –
En’hain pensava, “estragou tudo”!
–Por isso
vir atrás de você, você esquecer isso. – Sasha tirou de sua velha sacola o
maior tesouro de Gurei.
–Minha
caixinha! – Uma lágrima despontava no canto do olho de Gurei.
–Você não
tinha perdido ela?! – Perguntou En’hain.
–... –
Gurei ficou olhando para ela por um momento. – Podem nos deixar a sós?
–Claro... –
O que En’hain pensava por trás do sorriso forçado era algo como: “Caralho,
justo na melhor hora!
En’hain se
retirou com Akai e foram pra dentro do bar. O barman terminou de fazer a sopa –
Sasha tinha tomado mais da metade. E ficou pensando no que os dois estavam
falando lá fora:
–Nyaaa?!
Você não quer saber o que os dois estão fazendo? – Perguntou Akai.
–Não, não
quero Santiago... – En’hain estava perdido em seus pensamentos.
–Nyaaa?! –
Akai estranhou um pouco ser chamado pelo nome.
–E você,
bichinho levado, trate de escovar mais os dentes. Comendo tanto doce assim você
vai acabar ficando com cárie.
–Nyaaa... –
Akai não gostava que mandassem nele, mas estava curioso. – Como você sabe?
–Eu apenas
sei, meu amigo.– E ficou olhando para na direção da porta, pensando no que
acontecia do lado de fora. – Eu apenas sei...
Foi assim
que na Vila dos Gatos começou a ter também um cachorro...
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