Senhor de Castelo
Pelos
corredores da república dos guerrins, dois vultos perseguem outro que corria à
frente deles durante as horas silenciosas do descanso:
— Droga! Eu
jurava que eles não conseguiriam vir atrás de mim depois que eu conseguisse
controlar a flutuação!
— Parado
aí, Príncipe Dantir! — disse um deles.
— Merda! Me
encontraram! — o jovem guerrin atravessava os corredores mais rápido e leve que
o vento.
A
perseguição acontecia num estado de flutuação, onde o flutuador toma um estado
corporal parecido com o gasoso.
— Me deixem
em paz! Eu quero sair daqui!
— Você não
pode príncipe Dantir, os altarianos temem somente a ti e estão prontos para matá-lo
assim que sair da ilha!
— Eu não
estou nem aí para eles! Eu quero ver o meu irmão!
— Novamente
esta história! Seus mestres já não conversaram isso com você?
— Eles
estão errados! — Dantir reparou em algo. — Oh! Porcaria, onde está o outro?
O segundo
homem apareceu a sua frente no momento de distração e bateu as palmas,
liberando uma onda suave e luminosa que afetou o príncipe rebelde.
—
Miserável! Você vai se ver comigo! — caído no chão, ele sentia o corpo
completamente dormente. — Feitiço de paralisia? Que golpe baixo!
— Garoto...
— ele tirou o capuz negro revelando sua pele escamosa e seus olhos
amarelo-esverdeados. — Se eu fosse te caçar de verdade, eu já teria arrancado a
sua pele só pra te ver sofrer com a carne completamente exposta!
— Hunf...
Um Caçador Sombrio! E desde quando vocês recebem trabalho de babá? — Dantir
observava o triângulo negro invertido que se formava sobre o dorso da mão do
reptiliano.
— Você vem
dando muitos problemas aos Senhores de Castelo e com a guerra pela qual o
multiverso está passando, seus superiores pediram ajuda aos Caçadores para te
vigiar noite e dia...
O segundo caçador, enquanto se
aproximava, tirou o capuz, revelando uma pele úmida e tentáculos com ventosas
que se agitavam para trás do topo da cabeça como se fossem cabelos amarrados.
— Há quanto
tempo? — perguntou Dantir.
— ... —
eles não responderam. Pegaram cada um em um dos braços do príncipe e o ergueram,
levando-o de volta ao quarto.
Os
caçadores, depois de colocarem Dantir em sua cama, saíram e puseram suas mãos
aos lados da porta, invocando um feitiço poderoso que impediria Dantir de sair
novamente de seus aposentos.
— Ei! Não
vão tirar a paralisia de mim? — não houve resposta novamente. — Droga... Outra
vez! Já perdi a conta de quantas vezes eu tentei e não me deixaram sair dessa
ilha!
— Zzzz... —
o companheiro de quarto de Dantir roncava sem nem suspeitar da tentativa de
fuga.
— Não sei
como você consegue dormir meu amigo... Se fosse a sua irmã que estivesse em
perigo, será que você conseguiria dormir? Tenho dormido tão mal, acho que estou
sonhando novamente com Vaik...
— Zzzz...
— Se pelo menos você não tivesse
um sono tão pesado, poderia me escutar de vez em quando... — ele parou de
olhá-lo e fitou o teto, as luzes se apagaram e pequenas imagens fosforescentes
que imitavam um mapa do multiverso se acenderam. — Irmão, por favor, esteja bem.
Eu vou te buscar, eu prometo!
No criado mudo ao lado da cama,
uma caixinha de música em forma de cubo começou a tocar. Sua melodia era triste
e melancólica. Uma lágrima escorreu pelo rosto do príncipe e ele finalmente
adormeceu.
...
No meio da noite, uma voz começou
a cantar:
— Durma pequeno príncipe, não vá
se preocupar. Estou aqui para os pesadelos afastar. Os belos sonhos logo já vêm,
e pela manhã estará tudo bem... — a canção parou e ele começou a falar. — Durma
pequeno príncipe, durma e tenha os mais belos sonhos! Pois você é o escolhido
para salvar o multiverso!
...
Na manhã temporal seguinte:
— Acorda Kalliat!
— Zzzz...
Dantir pulou em cima do colega:
— Acorda dorminhoco!
— Ahn? O quê? Estamos sendo
atacados? — Dantir se levantou e saiu de cima dele.
— Não, idiota! É hoje!
— Hoje o quê? — o amigo se
levantou e pôs os pés no chão, esfregando os olhos.
— A formatura! Será possível que
você sempre esquece?
— Aaaaauuu... — Kalliat bocejou. —
Você tem que ser mais paciente cara, ser apressado assim ainda vai te causar
problemas...
— Argh! Não aguento mais você! —
Dantir bufou de raiva. — Fui!
— Carinha apresado... — e começou
a se trocar.
...
Depois da cerimônia:
— Tem certeza que essa tatuagem
fantasma condiz com você? — perguntou Kalliat.
— Vai começar de novo? — Dantir
olhava para o amigo, meio tenso.
— Relaxa... — Kalliat pulou pra
trás, o colega emanava uma energia estranha.
Dantir respirou fundo e falou:
— Este símbolo é importante pra
mim, nada mais... E esse seu dragãozinho? Será que ele aguenta no campo de
batalha... Hihihi...
— Os dragões de Oririn são os
melhores! — Kalliat ergue os punhos no ar.
— Sei... Duvido eles enfrentarem
manticores sentinelas de frente... Quanto mais velhos, mais poderosos eles
ficam, principalmente o seu veneno...
— Os dragões também! Os guardiões
do céu são incomparáveis!
Dantir sorriu com a reação do
amigo:
— Quem está sério agora é você...
Huhuhu... — o príncipe de Newho começou a rir com entusiasmo.
— Ora seu... — Kalliat o pegou
pelo pescoço num mata leão.
— Hahahah... Me larga...
Hahahah... Para! — Dantir não se aguentava.
Uma moça muito bonita viu a cena
e se aproximou dos dois:
— Ahn? Lana?! — Kalliat estava
surpreso ao ver a irmã na ilha. — Você não estava com Yaa, a mãe de todas as
fadas?
A moça de belos cabelos negros,
lisos e compridos com uma mecha branca, apesar de recaírem sobre o rosto como
uma perfeita moldura, tinha olhar de poucos amigos:
— Você não cansa de ser tão
infantil, irmãozinho?
— Oi, Lana? — disse Dantir,
tentando ser amigável naquele posição estranha.
— Olha quem fala... — Kalliat
largou o amigo. — Não sou eu que fica andando por aí com bonecas no braç... —
involuntariamente, o jovem castelar pôs bruscamente a mão na boca.
Lana emanava maru brilhante com
intensidade. Suas bonecas magicamente ganharam vida e desceram de suas costas.
— Cuidado com o que fala, maninho!
Estou treinando para dominar o meu poder sobre a maru. E posso dizer com plena
certeza que já posso fazer você engolir cada palavra que ia dizer.
— Aiai... Lana, já chega... —
intercedeu Dantir.
— Não diga nada! Eu estava mesmo
querendo saber o quanto a minha irmãzinha apreendeu durante todo esse tempo! — Kalliat
também começou a liberar uma grande quantidade de maru visível a olho nu.
— Você é um bobo mesmo! — bufou
Lana, indignada. Dantir se afastou, a situação estava começando a se complicar.
— Ataquem!
As duas bonecas começaram a
cantar, mais precisamente a emitir um som destoante que reverberava por todo o
corredor. Dantir tampou os ouvidos e virou-se de costas, agachando-se. Kalliat
se posicionou firmemente e abriu o peito, recebendo a investida sônica
diretamente. Com suas habilidades de resistência, um escudo curvo de energia
surgiu e refletiu o impulso. Ele levantou sua mão e com um movimento rápido,
contra-atacou, fazendo os cabelos de Lana esvoaçarem. Em seguida, bolhas de
força explodiram cegando momentaneamente a moça. Kalliat golpeou o ar, lançando
a irmã para trás.
— Droga! — gritou o filho de
Oririn, sentindo as energias sendo drenadas. — Quando foi que...
— Você precisa se preparar melhor...
— Kalliat tinha duas bonecas presas nas pernas que o imobilizaram. — É o que
mamãe sempre diz.
— E onde você escondeu essas
outras bonecas? Ahn? — a moça se levantou, sendo auxiliada pelas bonecas.
— Eu não as escondi, eu as fiz...
— Então era isso que você anda
aprontando, não é? Você viu isso Dan... — Kalliat tentou encontrar o amigo. Ele
havia sumido.
...
— E agora? O que querem comigo?! —
Dantir estava sendo carregado pelos Caçadores Sombrios.
— O daimio quer te ver... —
responderam visivelmente compenetrados com o que faziam.
Levaram o
príncipe até uma sala secreta, atravessando a parede. Tendo terminado o serviço
voltaram por onde vieram. Na sala havia uma mesa comprida e fina que se curvava
em círculo para trás dos mestres da ordem, chamas dançantes crepitavam de
adornos mágicos nas paredes laterais e, sentada em uma das cadeiras diante dos
daimios, havia uma moça de cabelos negros e roupas de couro escuro que
aparentava ter a mesma idade de Dantir. O jovem castelar sorriu: “Quem poderia
ser ela?”, pensou ele. Sendo convidado para se sentar, Dantir ficou surpreso ao
ver a senhorita mais de perto:
— NINA! —
gritou ele saltando da cadeira e tentando fugir pela parede que atravessara há
pouco.
— Surpreso
em me ver querido? — a moça, meio sem graça, sorria forçadamente.
— Eu não
sou seu querido! — Dantir não conseguira fugir, o feitiço para transpor sólidos
já estava cancelado.
— Ora, ora!
Ainda insiste nisso? Você sabe que um dia será meu, é o nosso destino...
— Não diga
bobagens! Eu nunca ficaria com você! — seu tom de voz era desesperado, chegando
a sentir calafrios.
Em sua mente se passavam as cenas
que deixaram Nina famosa na academia, como a vez em que derrubou Mundergrand,
um Giganto, humanóide do tipo comum originário de Gigantea do primeiro
quadrante (superplaneta de proporções dez vezes maiores que a maioria dos
astros férteis para a vida e cuja população possui indivíduos com, em média,
dez metros de altura). Ou a vez em que ela mandou um garoto para a zona sombria
por ter dado um cartão de dia dos namorados para ela — o pobre rapazinho saiu
de lá tomado pelo desespero.
— Eu não
teria tanta certeza, querido... — Nina olhou para o Daimio.
— Não... — o daimio assentiu
positivamente. — Mas, eu quero ser parceiro do Kalliat! Entendam, por favor,
nossos pais foram os melhores do primeiro quadrante e possivelmente os melhores
que a academia verá em séculos! Eu tenho que ser parceiro dele!
— Príncipe Dantir, em virtude da
Guerra Cósmica, você não pertencerá aos grupos comuns da ordem, você ficará na
elite...
— Não, não,
não... Não! Como pode considerar que eu e ela poderíamos ficar juntos na mesma
dupla, no mesmo grupo?! E Kalliat? O que ele vai pensar de mim quando souber
que não o acompanharei nas linhas de frente? Ahn?! Vocês pensaram nisso? Me
respondam?!
Um pequenino humanóide de Jigus
do terceiro quadrante – planeta de proporções inversas ao de Gigantea – chamado
Sêminus se apresentou, saindo de trás da bancada:
— Acho que posso responder a sua
perguntar... — começou, com sua voz fina que mais parecia um ruído irritante. —
Segundos os relatórios, vocês sãos os dois melhores espécimes que a ordem e a
academia poderiam selecionar para enfrentar os altarianos. Seus poderes estão
acima da média Tesla, aliás, acima da média das maiores pontuações Tesla que os
multibiólogos já puderam pesquisar.
— Criaturinha irritante... —
Dantir olhava para o homem de vinte centímetros com pleno desgosto.
— ...! — o jiguniano ficou com
medo e voltou para o seu lugar atrás da bancada, se escondendo.
— Hahahah... — Nina gostou da
atitude ruim do príncipe. — Você é sempre tão adorável assim, querido?
— Pare... De... Me... Chamar...
ASSIM! — Dantir gritou de raiva.
— Você me excita... — Nina estava
saboreando cada momento. — Adoro te ver cheio de raiva.
Dantir tentou respirar, evitando
ser “adorável” a garota de seu desafeto, se recolhendo de lado em seu assento.
Nesse instante, um mensageiro atravessou a parede e falou ao daimio:
— O terceiro acaba de chegar...
— Mande-o entrar.
— O quê? E o sistema de duplas?
Além dessa psicopata vai ter mais um?
— Silêncio! — respondeu com voz
poderosa. — Não serão toleradas insurgências de vossa parte, Senhor de Castelo!
— acalmando-se, ponderou. — O multiverso precisa de vocês três e nada mais
justo do que juntar a uma dupla de Senhores de Castelo um...
— Cheeeee... guei! Olá rapaziada!
Estou na área! — o terceiro integrante do novo grupo da elite castelar estava
muito animado. — Opa! Olá Nina, há quanto tempo! Dantir, como vai camaradinha?
— Não creio... — respondeu Dantir
tentando se esconder na cadeira.
— Hun... Como vai Lacroh? Os
Caçadores Sombrios não tinham acabado com você?
— Ah, gatinha, você sabe como é,
eu arraso com eles! Mantenho o meu currículo daquele jeito e se quiser... —
Nina lhe deu um tapa que fez seu rosto virar.
— Não termine essa frase,
estúpido! Quantas vezes eu já te disse que sou apenas do meu amado Dantir?!
— Var... vez... — Lacroh não
conseguia pronunciar direito, seu queixo estava deslocado.
— Você não é minha e nem eu sou
seu!
Com um estalo, Lacroh pôs o
queixo no lugar:
— Vocês ainda brigam desse jeito?
Pensei que vocês tinham mudado quando no separamos há oito anos...
— Ah! Nem me lembre! — falou
Nina, lembrando dos acontecimentos que ocorreram na Academia durante o
treinamento de guerrins.
— Esqueçam aquilo, por favor... —
cochichou Dantir.
— Ah, cara, não dá pra esquecer
não... — Lacroh sorria, iluminando seus olhos de tons rosáceos que refletiam em
várias cores. — A simulação estava fora de controle e tivemos de nos virar os
três juntos para tirar todos os guerrins daquela confusão infernal...
— Suas habilidades de prever o
futuro ajudaram muito... — completou Nina.
— Concordo... — disse Dantir.
— Heheh... — Lacroh esfregou a
cabeça. — Vocês são incríveis, a força de Nina e a determinação de Dantir nos
tiraram daquele sufoco...
— Acho que sim...
O daimio retomou a palavra:
— Espero que tenham chegado a um
acordo, a Ordem precisa de vocês para vencermos esta guerra.
— Se você falou, está falado! —
disse Lacroh, erguendo o braço acima da cabeça.
— Não há outro lugar que eu
queira estar que não seja ao lado do meu querido! — o sorriso de Nina denotava
certa maldade.
— E você príncipe Dantir?
Ele se levantou e se dirigiu
novamente à parede, respondendo de costas:
— Preciso conversar com Kalliat...
— respirou fundo e atravessou.
...
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