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quarta-feira, 2 de maio de 2012

Devil's Drink - 8# Shot


            En’hain e Gurei estavam sentados em uma mesa na Toca dos Gatos, sem falar um com o outro, até En’hain interromper o silêncio:

            –Até agora não consegui entender essa vida que levo... Será que existe razão pra tudo isso? O tempo todo, em casa, na rua, entre amigos... Em todo lugar me sinto odiado pelas pessoas, odiado pelo criador. Tudo isso realmente importa?

            –... – Gurei ficou calado.

            –Me diga, por que tudo está do avesso?! Porque eu me importo e eles não? Só tenho vivido essa vida na miséria, tentando apenas ficar em mim, tentando esquecer essas sensações ruins que me consomem e que me são causadas pelas outras pessoas. Não consigo fugir disso, nem me tornar mais forte. As dores continuam, meu rosto continua seco, minha alma continua mutilada...

            –Vou lhe dizer a mesma coisa que o criador me disse: “Problema seu”.

            –Como se eu já não soubesse disso! Como se eu não continuasse me sentindo uma formiga sendo esmagada com pura indiferença! Se isso realmente importasse, se realmente houvesse amor nisso tudo, porque então essa flagelação continua? É sempre a mesma coisa, dia após dia, nada muda pra melhor, só piora. Não conheço mais ninguém... Pior! Ninguém me conhece...

            –Vai lá pra fora e mostra a cara, se você quer tanto assim que te conheçam!

            –E o que mudaria? Eles continuariam zombando de mim. Essas sensações não mudam pra melhor, só pioram. Não há forças para nada dentro de mim, continuam vazias. Sempre estou exaurido, não tenho forças nem pra sair daqui. Sinceramente, não há nada para fazer lá fora. Tudo sempre confuso, as pessoas sempre me entristecem...

            –E porque você deixa?

            –Eu deixo? É justamente quando eu tento ter alguma esperança de seguir o meu caminho que isso acontece! Quando eu penso que dei um passo firme, mesmo que cambaleando um pouco, levo uma rasteira. Só porque os machucados não aparecem não quer dizer que eles não estejam em carne-viva. Seria bom se essa faca cravada nas minhas costas fosse retirada, porém, ela entrou fundo de mais, nem o criador tenta tirá-la daí. Porque ‘eles’ fizeram me parte de tudo isso?

            –Se mate, então!

            –Nem para isso tenho forças... Queria apenas ficar sozinho, que essas sensações malditas sumissem. O rombo que fizeram no meu peito continua expondo meu coração, me deixando a mercê de qualquer um. Já pensei em lançar pragas aos desgraçados, mas nem isso vale à pena. Seguir o caminho é minha única opção. Se ao menos pudesse fazer isso dormindo...

            –...

            –Assim eu poderia ficar longe de tudo, esperando que não haja mais ninguém para me perturbar e que finalmente eu pudesse acreditar nisso tudo, mesmo que realmente fosse tudo uma grande mentira. Tento entender pelo que esses malditos heróis lutam: se por egoísmo ou por essa mentira suja. Eles agem como ignorantes que persistem no mesmo erro que todo mundo gostaria de errar.

            –Você odeia aquilo que ama? – Indagou.

            –Talvez eu ame aquilo que odeio... Não sei. Sei que nem me lembro direito o porquê de ter entrado na faculdade de arquitetura. Possivelmente fosse a premissa de um sonho de tentar mudar o mundo construindo ele do jeito que eu acho melhor... Nem assim consegui me importar. E quando o dinheiro havia acabado então? Desisti do curso sem nem dar noticias do que havia acontecido.

            –Então você vive dizendo que faz faculdade de arquitetura quando na verdade...

            –Eu sei, é hipocrisia minha. É que eu achei que aquelas pessoas que estudaram comigo fossem legais por aquela ter sido uma grande época em nossas vidas. Me enganei feio! São elas as mesmas pessoas que eu sinto que me odeiam, que são indiferentes comigo, enfim... Depois que você não faz mais parte da vida deles, eles sequer mandam alguma resposta de volta. E o que é pior, só eu me sinto assim, só eu sou o desprezado. Não tenho mais ninguém...

            –E a sua família? Onde ela está?

            –Que família? Eles nunca se importaram se eu estava feliz ou não. Sempre fui uma ovelha negra desprezado pelos outros por sentir essas sensações que me impedem de ser como eles. Sempre a mesma coisa, eles me desprezam. Quando entrei na faculdade não tive apoio nenhum, o dinheiro sempre foi pouco, tiveram que fazer sacrifícios para pagar o meu material. Mas nenhum deles perguntou como eu me sentia. Eles queriam que eu continuasse e ainda assim não perguntaram como eu me sentia. Deixaram de lado, todos eles... Sempre tentei ser eu, no entanto, nem eu sei quem sou. Eu queria ser alguém que não existe.

            –...

            –Nem adianta me fazer essa cara de “seja quem você é” que não adianta, eu continuo não existindo. Sou puro faz de conta...

            Akai sai da cozinha comendo biscoitos:

            –Nyaaa! Vou lá fora...

            –Está bem, pode ir... – Akai saiu.

            –E ele? – Perguntou Gurei. – O que me diz dele?

            –Um dia ele vai beber meu sangue e esquecer-se de mim...

            –... – Gurei pensou um pouco. – Não foi você que disse que nunca faria isso?

            –Não entendeu ainda? Sou tão azarado que meu sangue está sempre vertendo pela minha pele quando ela é rasgada pelas minhas escamas... Uma hora uma gota vai terminar de me desgraçar por completo. Este é o dia que mais temo na minha vida...    –Vai ficar parado esperando isso acontecer?

            –E que escolha eu tenho? Só posso continuar meu caminho tentando não lembrar que um dia as coisas que tanto gosto vão quebrar e as pessoas que eu tanto amo não vão morrer.

            –Você está fudido!

            –Uma hora esta mão que finge que me afaga, que finge que isso me basta, vai perceber que eu nunca vou ser feliz de verdade, que eu nunca vou ser completo, que pra mim tudo me faz infeliz...

            –...

            –Uma hora vão se cansar de mim e se livrar de uma vez por todas deste brinquedo quebrado. Só posso esperar que isso aconteça... Nada mais.

            Gurei se levantou, se espreguiçou como bom gato e disse:

            –Vamos arrumar o bar, já está quase na hora de abrir.

            –Sim...

terça-feira, 1 de maio de 2012

Devil's Drink - 7# Shot

            O segundo neko que trabalha na Toca dos Gatos se chama Gurei. Ele foi um dos nekos que mais teve problemas com seres humanos. Maltratado ao extremo, tornou se um neko frio e antipático, sempre pensando no pior. Ele odeia os seres humanos, pois foram eles que arrancaram o seu olho direito...

...

            –Tem certeza disso? Eu preciso... Os nekos precisam de alguém que fique aqui para protegê-los caso a vila dos gatos seja invadida. – Perguntou o dono do bar.
            –Eu já me decidi... Eu sou apenas um estudante de Arquitetura. Eu não sei cuidar de gatos... – En’hain estava dando papinha para Akai que naquela altura já estava todo lambuzado.
            –Eu não vou forçar você a decidir nada. Mas fique certo de que no momento em que você atravessar de volta pela barreira do silêncio para o mundo humano, você vai esquecer-se de tudo que viu aqui...
            –... – En’hain queria voltar, mas também queria ficar e cuidar de Akai.
            –Eu preciso sair... Quando eu voltar quero que todas as suas coisas estejam arrumadas e você esteja pronto para partir. Você vai essa noite. – O dono do bar abriu a porta e já ia sair. – Eu já volto.
            A porta fechou. En’hain foi invadido por um grande pesar. Não queria pensar naquilo, mas era inevitável, queria chorar, se segurava apenas para não preocupar o baixinho que poderia perceber e tornar aquilo muito mais difícil. Alguém bateu na porta:
            –Será que o dono do bar esqueceu alguma coisa? Vou lá ver. – En’hain levantou-se e abriu porta. – Meu Deus!
            –Gunshin?! Preciso de sua ajuda... – Era um neko completamente sujo, diversos arranhões, machucados e um tapa-olho no lado direito do rosto.
Seu estado era deplorável. Não deu muito tempo, gemeu alto e desmaiou, caindo em cima de En’hain:
–E agora? O que eu faço?! – En’hain sentiu que não tinha muita escolha e o levou para o palco, pegou algumas cobertas para confortá-lo e trouxe alguns remédios para seus machucados. Abriu o algo etílico, virou o vidro para umedecer um pouco de algodão e tentou passar nas feridas do neko. Aquilo lhe parecia estranho, era como machucar ainda mais o coitado que gemia toda vez que lhe era passado o álcool na pele aberta.
            Subitamente, o neko segurou fortemente seu braço:
            –Por favor, Gunshin, mate-os... mate-os humanos! – En’hain se assustou e assim que o neko amoleceu a mão por causa das dores, rapidamente ele se afastou do enfermo. – Por favor, você precisa matar todos eles. Sei que você tem poder para isso...
            –Eu não sou Gunshin... – En’hain olhou de lado.
            –Você não é o dono deste bar?
            –... – En’hain não sabia como colocar aquilo em palavras. – Não, o dono saiu agora a pouco.
            –Nyaaa! – Akai se soltou de sua cadeirinha e veio ver o que En’hain estava fazendo, trazendo consigo um biscoito.
            –Akai, você devia ficar na sua cadeirinha! – Akai subiu em En’hain e foi até seu ombro para comer o biscoito. Achava que ali era um bom lugar para ver o que estava acontecendo.
            –Você tem um neko? – Perguntou o estranho.
            –Meu nome é En’hain... É, acho que eu tenho sim, ele não me larga de jeito nenhum...
            –Se você der seu sangue a ele, ele nunca mais vai querer te ver na vida...
            –QUÊ?! – En’hain não sabia que isso podia acontecer. – NUNCA QUE EU FARIA ISSO!
            –Nossa. Não grita. Agora até meus ouvidos estão doendo.
            –Me desculpe... Você ainda não disse seu nome.
            –Meu nome é... – O neko se sentou na beira do palco. – Meu nome é Gurei.
            –Bem... Gurei?
            –Sim...
            –Deixe-me terminar os curativos, sim?
            –Não precisa, deixa que eu mesmo os faço. – Seu tom era frio e ríspido.
            En’hain pegou os remédios e os deu para Gurei.
            –Me diga, En’hain, se você não é o dono do bar, você também não é humano, é?
            –Eu era... Esse tal Gun-sei-lá-o-quê que você disse dividiu seu sangue real comigo e despertou meu lado draconiano adormecido.
            –Draconianos! – Disse com tom irônico. – Vocês sempre prometem ajudar a todo mundo, mas no fim não ajudam ninguém!
            –Como assim? – En’hain estava confuso.
            –Você não sabe por que não existem outros draconianos neste planeta não é?
            –Não... – En’hain sentiu uma indireta.
            –Bem, os draconianos são famosos por ter um coração grande demais para caber no peito. O que significou sua extinção por causa dos humanos ambiciosos que arrancavam seus corações para tentar usufruir de seus poderes mágicos. Apesar disso, os draconianos não são naturais do planeta. Eles são viajantes estelares que procuram levar a paz ao universo. Combatendo o mal com seus poderes terríveis...
            –Oh! – En’hain estava alegre com aquela história.
            –Você não tem a menor ideia dos poderes que realmente tem, não é?
            –Nem um pouco...
            Gurei estendeu a mão e pegou Akai. Admirou-o por um instante... e começou a apertá-lo!
            –Nyaaa! – Gemia o bichinho.
            –SOLTA ELE! – En’hain estava ficando preocupado. – SOLTA ELE AGORA!!!
            –Por quê? Ele não é só um brinquedinho que te incomoda?
            –Nyaaa!!! – Gurei apertou mais ainda.
–EU JÁ DISSE PARA SOLTAR ELE, PORRA!
            –Se eu matá-lo, vou estar livrando ele de todo mal que a humanidade pode fazer a ele.
            –SOLTA AGORA!!!
            –Nyaaa!!!
            En’hain não aguentou a pressão, seu espírito draconiano se agitou, suas escamas e espinhos rasgaram sua carne mais rápido do que nunca, seus olhos já estavam vermelhos. Fez crescer um espinho na palma da mão e o apontou para Gurei:
            –OUSE-SE MATÁ-LO E EU TE ESTRAÇALHO AQUI E AGORA!!! – Seu tom de voz era horripilante, um verdadeiro demônio.
            –Resolveu mostrar sua verdadeira face... – Gurei parou de apertar Akai e uma energia verde brilhou de suas mãos, curando o pequeno neko. – Elemento VIDA, poder de cura!
            En’hain se acalmou e pegou Akai nos braços, aos prantos:
            –Vai ficar tudo bem agora... Vai ficar tudo bem agora...
            –Que comovente! – Novamente o tom de ironia e indiferença.
            –O que foi que eles te fizeram? O que foi que ELES TE FIZERAM?!!!
            –Eles? – Gurei tirou o tapa-olho. – Arrancaram meu olho!
            –... – En’hain cerrou os olhos, encarando Gurei. – Isso não é motivo...
            –Você nunca vai entender, não é? Se eu tivesse o poder de um draconiano, não haveria mais nenhum humano vivo na face da terra! – Gurei fazia gestos doentios, como se apertasse o planeta inteiro em suas mãos.
            –Akai não merecia isso...
            –Nyaaa?! – Akai havia acordado e estava mais esperto do que nunca.
–Akai, seu gatinho bobo... – O neko pulo dos braços de En’hain e foi pra cozinha. – Aonde você vai bichinho safado!
–Agora até ele tem medo de mim... – En’hain olhou para Gurei com um olhar assassino.
Akai voltou da cozinha com um biscoitão nas mãozinhas e o ofereceu a Gurei:
–FOME? Nyaaa!
–Mas, hein?! – Se perguntou En’hain.
–Haha... Que gentileza a sua, coisinha. – Gurei sorriu.
–Você deveria sorrir mais vezes... – Disse En’hain.
–Ué? Por quê?
–Você tem um sorriso lindo...
–...!

...

 Mais tarde naquele dia...

            –Cheguei! En’hain, você está pronto?! – En’hain foi receber o dono do bar.
            –Bem vindo de volta!
            –En’hain, você não vai?
            –Eu não vou...
            –Tem certeza? – En’hain olhou para Gurei que acabou dormindo em cima de uma mesa com Akai dormindo em cima dele.
            –Absoluta! – En’hain sorriu.
            –Que bom... – O dono do bar sorriu.

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Devil's Drink - 6# Shot

            En’hain estava dormindo quando, de repente, alguém veio acordá-lo:
            –Cacete! – Berrou ele. – Que susto que você me deu agora!
            –Café da manhã... Nyaaa! – Um neko de pelo avermelhado havia pulado em cima de En’hain.
            –Já vou Akai. – Esse era o nome dele. – Já vou pegar o seu café da manhã...
A vida no bar Toca dos Gatos era muito movimentada, principalmente porque En’hain precisava cuidar de seus amigos nekos que também trabalhavam no bar. O mais jovem e hiperativo de todos era Akai. Ele não costumava dar problemas, exceto quando não dava grandes problemas. Não fazia muito tempo que ele havia saído de sua caixinha, aliás, foi o próprio En’hain quem abriu sua caixinha. Aquele dia foi muito divertido...

...

            En’hain estava discutindo com o dono do bar:
            –Como assim eu tenho que ficar aqui? Eu não tenho ideia do que você fez comigo!
            –Se acalme En’hain, não precisa se exaltar tanto. Eu só vou sair um pouquinho para trazer o que está faltando no estoque. – Disse calmamente.
            –...! – A cara de En’hain estava completamente fechada, há quem diga que saía fumaça de cabeça. – É bom você voltar logo, eu sou apenas um estudante de arquitetura... Como é que eu vou fazer se um daqueles... daqueles gatos vierem aqui?!
            –Se acalme, você vai saber o que fazer. Arrume a casa e o seu quarto. – O dono do bar fez um cafuné na cabeça de En’hain, desarrumando seu cabelo. – Eu já volto.
            –...! – Mais fumaça estava saindo da cabeça dele, a porta se fechara e En’hain estava sozinho naquela casa/bar enorme, sem saber exatamente o que fazer.
            Aquele lugar era realmente grande, havia um grande balcão onde eram preparadas as bebidas e os aperitivos. Atrás dela havia uma grande estante com diversas garrafas de diferentes formas, cores e tamanhos. Também havia ali um pequeno palco, onde poderia se apresentar uma banda com até seis integrantes. Eram umas dez mesas no centro, quadradas e ligeiramente pequenas, todas com quatro cadeiras. Caso houvesse superlotação, haviam mais mesas no depósito e as quatro portas do bar poderiam ser abertas ampliando bem o espaço principal. Nas paredes haviam pequenas mesas triangulares para dois, deviam ser umas sete, mas uma delas estava guardada por se quebrado recentemente. No momento aquele lugar estava todo desarrumado:
            –Filho da mãe, deixou tudo pra mim! – Se irritou En’hain. – Ele ainda me paga pelo que ele me fez...
            En’hain foi lá para trás, na cozinha, e entrou na dispensa para pegar a pá e a vassoura, como também o latão de lixo, que teve de ser empurrado por ser grande demais para ser carregado. Uma varridinha ali, uma varridinha aqui, um pouco de poeira ali, alguns espirros pra acompanhar... Pronto, tudo no latão! Não estava ainda limpo, mas aquele grande lugar era muito difícil de limpar. Então En’hain pegou o balde e o esfregão, além de algumas flanelas e desengordurante para as mesas, estavam uma nojeira só. En’hain esfregou, esfregou, esfregou... em cima e embaixo até suas mãos ficarem vermelhas. Mas, sim, finalmente estava tudo ajeitado:
            –Agora está com cara de um estabelecimento descente! – Se alegrou o jovem. – Ufa! Ainda preciso ir lá para cima. Bóra!
            En’hain subiu as escadas que ficavam na cozinha para o primeiro andar da casa. O corredor de saída era comprido e envergava para esquerda, ao longo dele haviam diversas portas, as primeiras que ainda davam para se ver da escada eram os banheiros dos empregados:
            –Se ele realmente pensa que eu vou ser empregado dele... – Mais fumaça voando! – Bóra pros quartos! – É claro que ele passou direto pelos banheiros...
            O quarto não precisava de muita organização, apenas que as cobertas e os travesseiros fossem trocados e arrumados:
            –Eu não deveria ter feito aquilo ontem... – Falou, pensando no dia anterior. – Tudo arrumado! Agora posso ir tomar meu café da manhã...
            Ele já ia descendo as escadas quando se deu conta de algo:
            –...! – Sua cara fechou de novo. – Eu tenho que arrumar os banheiros...
            En’hain pegou um balde, sabão em pó, uma vassoura e a escova da privada, do jeito que sua mãe fazia em casa. Esfregou ali, esfregou aqui, deu descarga uma, duas vezes. Colocou o desinfetante na privada e saiu. Respirou fundo, bem fundo:
            –(Cof, cof) Que nojo! Como é que alguém poderia viver num lugar como esse?!
            Finalmente, tudo terminado, a Toca dos Gatos estava limpa como nunca esteve antes:
–Agora, o meu café da manhã! – Disse En’hain todo contente.
De repente, ouviu barulhos. Ele sentiu um grande arrepio: “Será que algum gato está tentando entrar?”, pensou ele. Ouviu atentamente e concluiu que não, o barulho estava vindo de cima. En’hain foi andando pelo corredor tentando encontrar o que provocava os ruídos e deu de cara com a porta do quarto do dono do bar. Como acabou batendo o nariz nela, a porta se abriu. Curioso como um gato, pensou ele, começou a subir as escadas para conhecer o quarto ‘daquele’ sujeito. Ao terminar o novo lance de escada, se deparou com um quarto amplo e aconchegante, uma grande cama, alguns armários em madeira esculpida a mão, uma escrivaninha feita de um grande tronco adaptado para ser mesa, preservando seu formato natural. Tinha grandes janelas, tendo uma grande vista para a vila dos gatos, com uma pequena varanda cheia de plantas que pendiam do alto da casa. En’hain sorriu. Mesmo como um estudante de arquitetura sabia que aquele tipo de lugar era raro e divino. Adentrou mais o quarto e foi para a escrivaninha, tocando com a ponta dos dedos aquele trabalho tão bem feito. En’hain deu um pulo! Novamente aquele barulho de antes, desta vez ele sabia de onde vinha. Em cima da escrivaninha havia uma caixinha de madeira muito bem esculpida, adornada com um rubi vermelho na parte de cima. Era a caixa que estava fazendo aquele barulho, ela estava pulando. En’hain parou com o susto e ficou observando a caixa com os olhos arregalados. A caixa mexeu outra vez, En’hain pôs um pé para trás, novamente a caixa mexia, En’hain colocou o outro pé atrás. De súbito, a caixinha começou a pular freneticamente e estava chegando à beirada da mesa. “Se essa caixinha se quebrar o que eu vou dizer pro dono do bar?”, pensava ele. A caixinha deu mais um pulo e estava preste a cair no chão... “Ufa!”, En’hain conseguiu pegar a caixinha! Foi então que a caixinha começou a abrir. En’hain estava de olhos arregalados, um neko pequeninho saiu de dentro dele apertando o rabinho:
–Nyaaa?! – Fazia o bichinho, enquanto abria os olhinhos para os primeiros raios de luz.
–Quê?! Você veio de uma caixinha? Dá onde saiu isso?! – O pequeno neko roçava no dedão de En’hain, enquanto ele ficava histérico. – E agora?! O que eu vou dizer pro dono do bar?! O que eu vou dizer...
–(Nhac!) – O pequeno bichinho deu uma mordidona no dedão dele.
–AAAAAIIIIII!!! – En’hain gemeu de dor. – Bichinho filha da mã... Aonde você pensa que vai?!
–Nyaaa! – O neko saiu correndo por todos os lados, pulou na cama, desarrumou os lençóis, derrubou os travesseiros e En’hain atrás dele.
–Volta aqui, peste!
O neko parou em cima da escrivaninha, balançou o rabinho e En’hain pulou em cima dele. O gatinho pulou e escapou. En’hain derrubou tudo que estava na mesa. Fazendo um barulhão. O peque neko saiu correndo por toda a casa, como se estivesse curioso pra saber o que era tudo aquilo. Abriu portas, desmanchou a cama do En’hain, entupiu a privada e deu descarga e desceu para o bar. En’hain estava estático ainda no topo da escada impressionado com a velocidade que a casa vinha abaixo:
–Como pode?! Como pode uma coisinha tão diminuta causar tanto desastre. – Disse, completamente atônito enquanto descia as escadas, temeroso de ver o resto do resultado.
Chegando ao bar, totalmente petrificado, virou poeira ao ver que seu esforço tinha ido por água abaixo, literalmente. Ouviu barulho nos fundos:
–Não, a cozinha! Meu café da manhã! Socorram meu café da manhã!
Novamente ficou petrificado, o neko já tinha devorado tudo e ainda por cima estava de babador com garfo e faço na mão!
–Akai... – Falou o dono do bar de trás dele.
–Como? Ah! – O espírito de En’hain estava saindo pela boca. – Você, já... já... chegou?!
–Akai... O pelo dele é avermelhado, Akai, entendeu?
–Escuta aqui! – En’hain deu um belo cascudo no dono do bar.
–O que foi? Ele está com fome! – O dono do bar esfregou a cabeça. – Caramba, essa doeu, magoou!
–...! – En’hain se irritou. – Como é que você deixa esse bichinho fechado numa caixinha?
–Eu não o tranquei lá... Os nekos nascem lá dentro.
–Ahn?! Vixi! Agora que o caldo entornou! Não entendo mais nada! – O dono do bar se levantou e pegou Akai nas mãos.
–Toma, agora você é a mãe dele...
–...! – En’hain desmaiou, segurando Akai, dessa vez o espírito saiu de vez do corpo dele.
Akai ficou olhando o moribundo, deu uma volta inteira, se espreguiçou e dormiu em cima dele e assim ficaram.

sábado, 28 de abril de 2012

Realidade dos Nekos

Este texto é uma copilação do texto de um amigo - aquele que é homenageado em um dos Drink Shots, ele deu sinal de vida. Como é um texto de onde tirei inspiração para fazer as histórias dos meus queridos gatinhos, achei que seria interessante se você, caro leitor, também pudesse lê-lo. Divirta-se! ^^



Realidade dos Nekos
Por Walter S. Reis

Olá! Não devo falar, nem escrever, mas aqui, nesta carta, escreverei...

            Nós, os nekos ficamos presos dentro de uma caixinha escura e vazia, onde não conseguimos ver nada alem de nosso próprio corpo encolhido, esperando sermos comprados, enquanto todos os dias apertamos a cauda para saber se estamos vivos ou mortos...
            Até que num determinado momento a caixa se abre e um olhar estranho nos olha e nos causa medo de congelar a espinha e no momento que somos pegos no colo tentamos conter nossos olhos da luz, pois dentro da caixinha não há luz. Aquela sensação de ser pego por alguém é muito boa e nos faz sentir vivos, enquanto a nossa calda fica totalmente abanando, mas nosso futuro é incerto, pois muitos passam por maus e bons momentos.
            Somos como mascotes sendo usados em varias ocasiões e sempre temos que mostrar um sorriso no rosto ou uma lágrima de luxuria e excitação. Nunca podemos reclamar, nem dizer nossas vontades e desejos, nem falar se não mandarem. A única coisa que podemos fazer é nos tocar a nós mesmos. Com pensamentos obscenos do quê?
            A nossa ideologia esta marcada em nossos olhos e só um neko entende o outro. Mas é restritamente proibida a união de ambos. No entanto, não conheci mais nenhum da minha espécie depois que me tiraram de minha família de sete irmãs, um pai neko aku e uma mãe neko mibu, pois nossa família é de sangue puro. Porém aqui nós somos os seres mais desprezados pela humanidade, visto apenas por um rostinho ou corpinho bonito. No fim somos vendidos, às vezes maltratados, o que torna a eternidade desgastante... mas sempre que pensamos estar onde merecemos estar, algo cai e atrapalha ou então simplesmente somos esquecidos e não podemos demonstrar uma lágrima que não seja de desejo. Porque, por traz de um rostinho e de duas orelhinhas de gato, tem uma cabeça pensativa que só pensa no porque de tudo e no porque de ser usado, amarrado e sem saber o porquê de estar apanhando.
            Os anos se passam e pessoas entram e saem das nossas vidas como nuvens sem água, levadas pelo vento de uma parte a outra. Sem notar passei duzentos e vinte e dois anos pensando em alguma mudança. Mas acho que agora nada mais importa, porque serei vendido novamente e comprado novamente até que se complete meu ciclo de leito e que a mortalha vença. Pois tudo é incerto, sabemos que é inevitável... “Vida aos apreciadores da morte e morte aos tolos sonhadores”, o que mais eu poderia expressar se minha boca se abrisse para pelo menos gritar? Que assim seja! Se meu corpo junto ao meu coração serve para ser vendido, que minhas emoções sejam queimadas, que o sorriso meigo, as lágrimas de luxuria e o êxtase invadam meu corpo, inundando minha alma na lama de Vênus, que o uivo dos pecadores soe como melodia, que a dor se torne apenas mais um motivo para se sentir bem e que a mentira da ilusão seja posta como verdade, assim como meus olhos enganam a todos os seres vivos. Sem mais.
            Apenas viva como me disseram: “Quem tem sentimento de ódio ou simplesmente amor, continue fingindo que está tudo bem, porque tudo piora e tudo melhora; a morte não espera você pensar e repensar”.