Dia de Milagre
“Este é o
dia em que um aprendiz deve testar e abrir sua mente para fazer o impossível, e
acreditar que mesmo quando todas as esperanças se vão, sempre há a chance de
algo realmente bom acontecer.”
...
O
multiverso se acalmou, toda aquela energia estava começando a diminuir e se
dissipar. O farol de Nopporn continuava a brilhar com sua incrível chama
azul-esverdeada que se intensificou ainda mais. A Espada do Infinito reagiu ao
chamado da anciã e deixou o corpo de Thagir que voltou a ser como era. O
artefato místico voou pelos céus da ilha de Ev’ve e parou acima da torre,
brilhando como uma estrela, removendo toda a maru sombria que ainda escurecia
as estruturas brancas e acolhedoras que os Senhores de Castelo conhecem tão
bem. O céu azul retornou, as defesas da ilha voltaram a funcionar e lá, um
pouco além do anel defensor, quatro colossos espaciais gigantescos orbitando em
uníssono com a ilha e o sol artificial voltava a iluminar aquela terrível noite
escura. Senhores de Castelo e aprendizes bradavam mais do que nunca pela
vitória que chegava com o amanhecer.
Dânima e
suas filhas vieram ao encontro do pai e marido que tanto amavam, e se abraçaram
fortemente com o calor da certeza que tudo ficaria bem dali para frente. Nos
alto-falantes, alguns novos sons surgiam e o pronunciamento de Vidara começou:
–Filhos de
Nopporn! O dia amanheceu e as trevas se foram! Mais uma batalha chegou ao fim e
temos muito que concertar e reparar, o trabalho e esforço de vocês serão árduos
para trazer de volta o que tínhamos antes, mas tenho certeza que a força de
trabalho unida de vocês logo terminará com esta simples tarefa! Descanse um
pouco e ajudem a quem puderem, teremos um longo dia pela frente! – Os anciões
já deveriam ter suas forças renovadas e o estado de petrificação desfeito
quando a Espada do Infinito voltou para o seu lugar de descanso.
Com a ajuda
de todos, as populações que estavam aprisionadas nas Estrelas Escuras desceram
para a ilha e eram prontamente atendidas por aprendizes e castelares, era um
número incontável de pessoas e animais, de Curanaã, Oririn e alguns outros
planetas. Alguns Capitães que estavam nas redondezas do centro do multiverso
aportaram no porto da ilha e disponibilizaram seus navios para ajudar com a
população, trazendo mantimentos e outras provisões.
Estava tudo correndo muito bem,
até que se houve um tumulto causado pelos Caçadores Sombrios. Os anciões, como
sempre, preferem ponderar no salão de reuniões sobre o próximo passo a ser
tomado, enquanto aqueles que estão sendo julgados permaneceriam na prisão
provisória da parte baixa da ilha, não fosse um pequeno problema com Histério,
o cavaleiro fantasma, e seu filho Xerubim. Thagir, após ouvir o que estava
acontecendo, foi em seguida para a Estrela Escura onde os caçadores se
escondiam e viu que a coisa não andava muito bem:
–Eu não vou
deixar o meu filho!!! – Depois de se livrar do controle do Comedor de Sonhos,
os caçadores perderam a aparência sombria e pareciam mais com humanos agora.
–Senhor,
você será encaminhado para as celas e permanecerá por lá até os anciões
chegarem a um veredicto. – Ponderava um dos guardas.
–Vocês não
vão fazer nada com o meu filho!!! – A criança chorava atrás das pernas do pai.
A armadura
que Histério usava não tinha mais o poder fantasmagórico de antes, mas continha
muito poder e ele insistia em afastar os guardas castelares. Thagir chegou o
mais depressa que pode e tentou ajudar como podia:
–O que está
acontecendo aqui? Por que todo esse alvoroço?
–Mestre
Thagir! – O guarda ficou espantado com a presença do grande Senhor de Castelo.
– São esses dois, eles devem ser levados para as celas e insistem em evitar o
nosso auxílio.
–Deixe me
ver... – O rei de Newho se aproximou. – Seu nome é Histério, não é?
–Sim... – O
homem ainda estava inquieto. – Eu não quero que levem o meu filho!
–Se acalme,
não vamos fazer nada ao seu filho. Venha conosco, tudo ficará bem.
–Não, eu
não vou voltar para o meu planeta natal, jamais eu farei isso de novo!
–E qual
seria o seu planeta natal? – Thagir se mantinha calmo para ouvir o antigo
inimigo.
–Eu não vou
dizer! Eu não vou voltar pra lá! Se afastem do meu filho! – Uma onde de força
derrubou Thagir e os guardas.
Nesse
momento, o grande ancião N’quamor adentrou o lugar com mais guardas castelares:
–Já chega!
Os Caçadores Sombrios já trouxeram problemas demais por um único dia, levem-nos
imediatamente.
–Não, me
larguem! Deixem meu filho em paz! – Vários castelares mais bem equipados os
estavam rodeando com o que pareciam ser inibidores de força.
–Grande
Ancião? Por que estas medidas tão drásticas, eles só estão com medo...
–Thagir...
– Seu tom era austero. – Estamos tomando apenas medidas provisórias, nada
definitivo. Temos urgência em cuidar das milhões de pessoas que abarrotam
nossas ruas. Isso se faz necessário...
–Eu não
teria tanta certeza... – Fentáziz acabara de chegar ao salão da Estrela Escura.
–Você?! O
que faz aqui? – Thagir e o ancião acharam estranho a intervenção do repórter.
–Vim fazer o
que preciso fazer... – Fentáziz parou os guardas e chamou a atenção do
garotinho, se abaixando e abrindo os braços. – Venha, pode vir Xerubim.
O garotinho
hesitou um pouco, com o rosto molhado e o nariz escorrendo de tanto chorar e se
dirigiu para perto de Fentáziz:
–Isso, bom
garoto. – O repórter levantou-se junto com Xerubim num abraço, enquanto
esfregava as mãos nas costas do menino que começava a se acalmar.
–...! –
Histério estava surpreso. – Xerubim nunca ficou assim com ninguém!
Fentáziz
olhava para os seus dois superiores com olhar de desaprovação e levantou um
pouco a camisa do garoto, mostrando diversas cicatrizes que deveriam ser muito
profundas:
–Seu
planeta natal... – Fentáziz virou-se para Histério. – É Adrilin, não é?
–... – O
cavaleiro de armadura apenas mexeu levemente a cabeça dizendo que sim.
–Como eu
suspeitava... Xerubim não era um caçador que obteve seus poderes do comedor de
sonhos, ele é mais uma das crianças que acabaram nas mãos dos cientistas loucos
daquele planeta...
–Espere! O
governo de Adrilin nunca permitiria isso, os poderes que ele tem são poderosos
demais. – Interveio Thagir.
–Receio que
não são esses cientistas. Estive com Alvo e Blanco agora a pouco para confirmar
a possibilidade e eles me disseram que alguns dos cientistas gêmeos de Adrilin
sequestravam crianças univitelinas para experiências desumanas. Há alguns anos
anunciei uma pequena reportagem sobre Adrilin que falava sobre crianças
desaparecidas. Reconheci o brasão da armadura de Histério, é uma ordem fundamentalista
que prega coisas desse tipo como coisas normais e que aparentemente tem alguma
ou pouca ligação com o governo... Estou certo, cavaleiro?
–... –
Histério baixou o olhar, tentando fugir de seu passado. – Eu nasci com um irmão
gêmeo, mas por complicações médicas ele veio a falecer e tive uma infância
solitária naquele planeta... Quando já tinha idade para sair da casa dos meus
pais, pedi a eles que me dessem uma viagem interplanetária. Nesse novo planeta,
conheci a mãe de Xerubim. Levei-a para Adrilin e nos casamos. O povo sempre
ficava comentando sobre a nossa relação, que a minha esposa lembrava alguns
adrilinianos, eu não liguei. Ela estava grávida e foi então que a desgraça
começou. Vândalos pintavam a fachada da nossa casa com palavras como: “Solitários”,
“Sem irmãos”, “Uni”... Sempre duas vezes. Por causa disso e de outras situações
mais constrangedoras, a gravidez dela passou para uma gravidez de risco, e veio
a falecer, dando a luz a um filho único. Eu estava feliz, pude ter perdido quem
amava, mas ganhei o melhor filho do mundo. Até ele ser sequestrado...
Histério
estava chorando. Os guardas o soltaram e Fentáziz levou o filho de volta ao
pai. O repórter perguntou algo no ouvido da criança e ela apontou para o corpo
do arauto que estava mais adentro do salão. Thagir e N’quamor olhavam curiosos
para saber o que o simples repórter estava fazendo, trocando alguns olhares de
vez em quando. Os outros caçadores que se escondiam pelas instalações do centro
da estrela, também demonstraram interesse, aparecendo de seus esconderijos.
Fentáziz procurou por algo e encontrou, era a esfera amarela que Xerubim usava
como arma. Ele sentiu algo diferente ao tocar naquele objeto que começou a
brilhar intensamente, sumindo no ar:
–Ué?! Que
esfera louca! Disse-me que tudo iria melhorar... – Fentáziz estava admirado e
retornou para junto do caçador e seu filho. – Desculpe, a bola se foi... Tome.
– Ele tirou um pequeno docinho caramelado do bolso. – É tudo que eu tenho.
A criança
ficou feliz com o agrado, sorrindo abertamente. De repente, um guarda castelar
entrou correndo no recinto:
–Grande
ancião, grande ancião, temos grandes notícias! – O jovem estava esbaforido.
–O que foi
meu filho, o que aconteceu?
–É o seu
planeta natal... Ele reapareceu em sua orbita original!
–...! –
Todos estavam surpresos.
...
Transmissão encerrada.
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