segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Devil’s Drink 33 – Cris...

Leia a Devil's Drink 32 primeiro!

Devil’s Drink 33 – Cris...

 

            – Cris! Cadê você! – o menino adora se esconder. – Apareça! Tenho que colocar a sua roupa! – principalmente depois do banho.
            Os dias que comecei a ficar cuidando de Cristian, filho de Minerva e reencarnação de um lobisomem albino do clã nórdico, têm sido muito movimentados.
            – Menino! Apareça! Já estou cansado de te procurar!
            Minha casa no Brasil é um pouco grande. Na verdade, nem é uma casa, está mais para uma caverna escondida no meio da mata atlântica da cidade de São Paulo – um dos poucos locais que ainda se mantém integrados à natureza naquela região urbana. O local é uma reserva de área verde e não preciso me preocupar tanto com intrusos humanos. Quem quiser me encontrar basta chamar o meu nome e, se eu estiver disponível, atenderei ao chamado. Alguns bruxos e seres sobrenaturais me conhecem, já ouviram falar do meu nome. Obviamente só de relance, não quero ser encontrado por quem não merece. Meu sangue é precioso, meus poderes mágicos estão além da expectativa e ainda posso me transformar gradativamente em dragão. Este sou eu, Victório Anthony, um draconiano que tem muito mais a demonstrar do que aparenta. E agora eu estou cuidando de uma pequena criança:
            – Cris! Merda... Cadê você!

            Procuro por ele sempre onde está mais quente. Seu corpo é muito frio, podendo suportar baixas temperaturas, mas parece que isso o incomoda. Diversas vezes o encontro perto da lareira (acendo de vez em quando para liberar o poder do fogo) ou procurando um raio de sol para se esquentar. Quando o pego nos braços, quentes por causa da condição de dragão, ele praticamente some no meio deles, se apegando a mim sem querer sair.
            – Onde está você menino!
            Algo me preocupa no Cris. Não sei se os acontecimentos antes ou durante de seu nascimento provocaram isso, só sei que ele não tem emoções aparentes, como um autista. Comumente ele está sempre olhando, por vezes prostra a cabeça para frente e depois volta para trás. Apenas isso. Talvez ele esconda as emoções por causa de algum trauma ou simplesmente não queira falar. Ele já tem três anos e nunca pronunciou uma palavra! Não tenho do que reclamar, Cristian tem sido um ótimo menino, exceto por se esconder quando bem entende.
            – Cris, você está aí fora?!
            Dentro de casa há uma grande árvore que às vezes perde a folhagem e fica somente com lindas flores amarelas. Acho que se chama Ipê, ou alguma coisa assim. E não é que ele já aprendeu a subir em seus galhos! Reforcei os galhos com meus poderes e pedi à dríade que mora nela para tomar cuidado com o Cris se ele ficasse subindo e descendo por eles. Ela concordou, apesar de sentir que o seu calor era roubado por ele. Os outros elementais também foram avisados, principalmente as ninfas das flores que adoram uma boa fofoca e saem falando sobre qualquer coisa, aumentando um pouco ali e aqui. Quase tive um infarto quando me disseram que ele havia caído num buraco cheio de cobras e estava quase morto. Na verdade, ele havia pisado em uma poça d’água formada pela chuva molhando algumas flores, deixando as ninfas ressabiadas. De fato, ser ligado à natureza tem seus problemas...
            – Ipê amarelo, você viu o Cris? – a árvore apontou para o largo buraco que fica acima dela, deixando os raios de sol passar. – Esse menino viu! Se ele tentar descer mande os silfos me avisarem, por favor!
            Saí pela entrada da caverna, que se abre e fecha magicamente pelos gnomos. Do lado de fora a mata fechada esconde perfeitamente o local, ninguém poderia dizer que um draconiano e um lobisomem de sangue real ainda muito jovem moram ali. Tentei deixar o local parecido com uma casa, trazendo alguns móveis que combinassem com o clima místico e natural. É um certo problema quando a madeira começa a florescer do nada e as abelhas insistem em entrar lá dentro. Nada que uma boa conversa não resolva, mas o zumbido incomoda.
            Já estava anoitecendo, eu levava uma toalha numa mão e uma muda de roupa na outra. Segui a brisa fria que se formava no local e logo o encontrei, admirando o por do sol por entre as árvores.
            – Cris! Não me ouviu te chamando? – ele ficou me olhando com seus grandes olhos dourados. – Agora você vai ter que tomar outro banho! Está todo sujo de novo!
            Enrolei-o na toalha, pus lhe a roupa e o levei para dentro. Conforme eu dissera, ele se acomodou em meus braços com vontade, tremendo um pouco. Tendo preparado a lareira especialmente para ele, aticei as salamandras para que pegassem fogo acendendo a madeira seca e coloquei um caldeirão com água para esquentar. Vendo as chamas que crepitavam, ele desceu dos meus braços e ficou observando o fogo. A brasa amarela iluminava ainda mais aqueles belos olhos.
            Com o banho pronto, ele entrou na banheira e ficou lá dentro. Como ele não faz qualquer movimento voluntário além de se esquentar, tenho que esfregar para ele.
            – Levante o pé... – ele obedece. – Como sempre, está preto!
            Depois do banho tomado, enxugo-o e ponho lhe novamente a roupa.
            – Desta vez eu tenho uma surpresa pra você! – peguei um pacote embrulhado e ponho na mão dele. Tenho de ajudá-lo a abrir. – E então? Gostou?
            Cris ergue diante de si uma blusa de moletom amarelo bem quentinha. Ele põe, espero alguma reação, ele fica me olhando e eu olhando ele. Ele se levanta e me abraça. Eu o aperto com carinho.
            – Que bom que gostou! É da cor dos seus olhos!
...
            Do lado de fora da caverna, no meio da noite, ouço alguns lobos uivando...
...

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