Nascemos para morrer
Nina estava
apreensiva, esperando que algo acontecesse. O Thagir vermelho não entedia a
animação da garota, prédios de várias toneladas estavam em cima do Senhor de
Castelo, não tinha como ele sobreviver:
– Nunca
pense isso de um Senhor de Castelo, bobinho! – a menina sorria docemente para o
escravo pessoal.
– Odeio
quando você faz isso... – o caçador sombrio desconversava.
– Ele está
vivo, eu sei disso. Vamos lá! Pare de se esconder, não tem como você escapar de
nós! – Nina colocou as mãos ao lado da boca para que o som ficasse mais alto.
– Vejo que
vocês não desistem tão fácil... – Dimios apareceu de repente, atrás deles.
–
Miserável, como eu não percebi você aí atrás? – o Thagir vermelho estava
revoltado por ter suas habilidades de percepção superadas.
– Então
você está aí! – a menina batia palmas de contentamento. – Meu querido Thagir,
use-o.
– Como
quiser... mestra. – o caçador sombrio ficou de frente para Dimios e liberou os
poderes do Olho de Rudnaht, forçando o castelar a ver alucinações.
Dimios
resistia como podia e liberou uma onda sônica da Garra de Sartel que derrubou
os adversários no chão:
– Não me
subestime! – gritou o castelar, agarrando o Thagir vermelho pelo pescoço depois
de um salto com um movimento veloz que o deixou próximo ao inimigo.
O Thagir
vermelho estava preso, sem conseguir respirar. Nina estava atordoada no chão e
Dimios continuava com o adversário na mão, apertando forte:
– Não... Subestime...
Você... – o caçador liberou uma espessa fumaça escura depois de se poder ouvir
um estalo de ossos se quebrando.
A fumaça
preta tomou o lugar e sujou o capacete de Dimios que já havia soltado o Thagir
vermelho. Do meio do breu, duas feras mutantes surgiram em disparada para
atacar o castelar. Dimios se esquivou das garras da primeira fera e arranhou a
segunda na barriga que caiu em cima da outra. Elas não ficaram paradas muito
tempo e partiram para o segundo ataque, desta vez cercaram o Senhor de Castelo
ficando uma de cada lado para atacar as duas de uma vez. Dimios ficou parado,
observando seus movimentos esperando que elas começassem e quando foram pra
cima dele, o castelar se aproveitou do ataque para derrubar as duas novamente.
Desta vez as feras deformadas ficaram mais algum tempo imóveis no chão,
estáticas, até explodirem seus corpos liberando toxinas extremamente venenosas.
Dimios estava bem por usar a suit de sobrevivência que ficara completamente
melecada com as tripas dos seres grotescos que havia enfrentado. Procurou pelos
inimigos, mas sentia que eles fugiram para algum lugar. Ele tentou entender o
que aquela menininha queria com ele, e ainda por cima acompanhada do Thagir
vermelho, o inverso do rei e castelar de Newho de Curanaã! Dimios pensou bem e
concluiu:
–Eles já
sabem que ele está aqui... Eles queriam informações! – Dimios cerrou os dentes,
ficando com uma expressão de extrema raiva. Ele olhou para o monte de destroços
que quase lhe caíram na cabeça e mandou um raio de maru destrutiva que levantou
a poeira bem alto nos céus. – Desgraçados! Me usaram!
O Senhor de
Castelo virou-se para o outro lado e seguiu sua direção, pensativo: “Se você
estivesse aqui...”
...
Poderiam
ter sido alguns segundos para o tempo normal, mas as alucinações de Dimios
foram piores do que aparentaram. Em sua mente, lhe vinha os momentos em que seu
ex-parceiro castelar estava morrendo. No começo, quando eles eram guerrins,
Dimios era diferente, seu sorriso alegrava qualquer pessoa que estivesse com
ele. Ele era determinado, extrovertido, batalhador. As lembranças da morte de
seus pais que deixaram-no órfão muito cedo, com apenas cinco anos, era algo que
ele não aparentava. Mesmo sonhando diversas noites com as pessoas que iriam
morrer em alguns dias – seu dom natural –, isso não lhe incomodava, tinha ao
seu lado o melhor amigo que alguém poderia ter. Eles cuidavam um do outro, nos
piores momentos, nas piores horas. Em batalhas, desvantagens não existiam, cada
um sabia bem o que o outro iria fazer sem dizer uma palavra, anulando qualquer
adversidade. Eles estavam seguros de suas vidas. Naquela época, Dimios não
tinha a Garra de Sartel no lugar do braço esquerdo...
Dimios
continuava caminhando, e a cada passo, sentia sua mente quebrar aos poucos.
Queria colocar a mão na cabeça para diminuir a dor, mas o capacete de vidro não
deixava, o que o irritava mais ainda. Respirava profundamente, tentando
esquecer o sangue que estava escorrendo pelo chão por causa da chuva que fazia
naquele dia e toda vez que ele piscava os olhos, as imagens de suas mãos
ensanguentadas eram perfeitamente visíveis:
– Por quê?!
Por que você tinha que morrer daquele jeito seu estúpido! Eu não pedi pra você
me salvar, droga!!! – ele gritava desesperadamente.
Uma voz, a
mesma voz do seu parceiro, pareceu lhe falar ao ouvido, do mesmo jeito que naquele
instante em que ele estava atordoado com a cena que presenciava. A voz lhe
dizia:
– Nós
nascemos para morrer...
A mente de
Dimios simplesmente se apagou, com a Garra de Sartel vibrando energeticamente
com alto intensidade. Ele veio ao chão, meio desacordado, numa espécie de coma,
ele via as coisas se mexerem, mas não conseguia se mexer. Alguém se aproximou e
começou a arrastá-lo dali...
...
Em mais um
delírio, Dimios teve um sonho, era o primeiro que tivera em muito tempo. Nele,
ele via a foice da morte pender sobre as cabeças dos Senhores de Castelo. Um
deles iria morrer...
...
Desta vez,
quem acordou em algum lugar foi Dimios. Estava num ambiente fechado,
aparentando alguma organização. Seu coração estava disparado e a suit de
sobrevivência havia sido removida. No ar, pairava o cheiro de alguma comida boa
sendo preparada, num canto do recinto uma criança de cabelos negros com manchas
vermelhas olhava curiosa para ele. Vendo que o homem havia acordado, chamou o
irmão:
– Vaik! Ele
acordou! – o menininho saiu correndo.
O garoto
mais velho entrou algum tempo depois trazendo um prato metálico com uma sopa
que cheirava muito bem, deixando Dimios constrangido por aquilo fazer a barriga
dele roncar. Sem dizer nada, ele tomou o prato a sua frente, segurando-o com um
pano trazido por Vaik, que ficou observando ele se satisfazer com a primeira refeição
com que Dimios se alimentava em trinta e seis horas desde que caiu da nave
estelar. Terminando o prato, entregou-o ao garoto, que disse:
– Espero
que tenha gostado, Dimios...
– Como sabe
quem eu sou?
– Muitas
pessoas neste planeta possuem poderes telepáticos...
– Mesmo crianças
como vocês?
–
Principalmente nós... – Vaik se levantou, e prosseguiu para fora do salão
depois de sorrir para o Senhor de Castelo.
...